Quando o coração vive no modo replay
E por que isso não é azar, nem destino — é história não resolvida.
Que atire a primeira pedra quem nunca se viu vivendo relações “iguais” com pessoas diferentes.
Pra algumas, isso nem chega a ser questionado — e assim, nasce a ideia de que toda relação é assim mesmo.
Quem observa de fora costuma ter uma leitura rasa. Diz que é “dedo podre”, que “gosta de sofrer” (cada ideia, né?), ou que basta fortalecer o tal do amor próprio — e aí vem a onda de academia, skincare, mantras.
Nada contra, quando essas práticas estão alinhadas com o que faz sentido pra cada um.
Mas o que essa narrativa simplista desconsidera — e banaliza — é que repetir, muitas vezes, é a única linguagem que a dor conhece.
Você não repete porque quer.
Repete porque aprendeu — sem palavras — que aquilo era amor.
Que aquilo era cuidado.
Que aquilo era o possível.
Já perdi as contas de quantas vezes ouvi, em sessões:
“De novo estou aqui.”
“De novo aceitei menos.”
“De novo me perdi tentando amar.”
E não, isso não é fraqueza.
Muito menos “falta de vergonha na cara”.
É um roteiro que não foi você quem escreveu, mas que aprendeu a decorar com perfeição.
Porque muitas vezes esse roteiro vem das primeiras referências de amor: seus pais.
E a gente sabe o quanto pode ser difícil questionar o que a família ensinou como certo, né?
A verdade é que toda repetição carrega uma história não resolvida.
E o nome disso não é azar. Nem destino.
É lealdade.
É a forma como se aprendeu a existir nas relações.
Ou como foi preciso agir para receber amor dentro da família.
Você percebe?
Não é sobre escolher mal.
É sobre ainda não conseguir escolher diferente.
Porque escolher algo novo exige uma ruptura com o antigo.
E romper com o velho, às vezes, é sentir que está traindo quem mais se amou.
Na abordagem sistêmica, isso tem nome: lealdade invisível.
Fios que ligam você a quem veio antes.
Que ditam, sem alarde, como você ama, cede, se doa, espera, se cala.
E não, não se trata apenas de olhar para o passado como quem folheia um álbum antigo.
É olhar com escuta.
Com profundidade.
Com o cuidado de quem não quer encontrar culpados — mas compreender os caminhos.
Terapia, nesse sentido, não é uma ferramenta. É uma travessia.
É desaprender o que estava enraizado para criar novas possibilidades de se relacionar.
Não basta desejar um amor saudável.
É preciso se tornar alguém verdadeiramente disponível para isso.
Alguém que sustente uma relação diferente sem se assustar.
Sem perder o interesse.
É nesse espaço que o que se repete ganha nome.
E que, aos poucos, você descobre:
Que amar não precisa doer.
Que cuidado não combina com medo.
Que reciprocidade não deveria ser um prêmio, mas o mínimo.
Quando se compreende a história que se repete, nasce espaço para criar novas formas de viver.
Não sem dor.
Mas com consciência.
Com coragem para bancar a vida que se deseja.
E, mais do que isso: com liberdade.
Porque repetir no escuro é sobrevivência.
Mas escolher no claro… é potência.
Pra mim, é aí que mora a beleza do espaço terapêutico.
Não se trata de retirar a dor. Se ela existe, é porque cumpre um papel.
Terapia, pra mim, é como artesanato.
Cada encontro é tecido à mão.
E nesse processo, vamos costurando narrativas, ampliando sentidos, criando novas formas de existir.
Se esse texto tocou algo aí dentro, compartilha com alguém que vive se perguntando por que tudo se repete.
Pode ser o começo de um novo caminho.
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Toda semana, um convite para enxergar sua história com mais cuidado.
Aqui, cada palavra é costurada à mão. Vamos juntos?
Eu já sou muito apaixonada pela sistêmica e te acompanhar só reforça isso dentro de mim! Como bem disse a colega acima, vc nos inspira muito! Futura psicóloga aqui tbm! ✨
Seu texto me faz pensar no tipo de psicóloga que eu quero ser. É muito inspirador! Obrigada 🩵